Um bar, um senhor, uma lição sobre empatia
- 6 de out. de 2020
- 4 min de leitura
Era uma noite de lua cheia, com poucas nuvens no céu. Infelizmente não se podia ver muitas estrelas em razão da poluição que arrebatava a cidade. A temperatura era amena e agradável quando dois amigos, Rubens e Ricardo, resolveram ir até um bar para conversar.
Logo que chegaram no local, se sentaram e fizeram seus pedidos. Ambos entusiastas da filosofia e da psicologia, começaram uma conversa sobre virtudes. Cada um dava seu ponto e argumentava de acordo com sua percepção.
Assim que foram falar sobre empatia, se aproximou um senhor. Ele não tinha muita barba, mas ela estava por fazer; suas vestes eram rudimentares e um pouco sujas, além disso ele não possuía alguns dentes. O senhor logo pediu algum dinheiro para que pudesse comer.

Ricardo trabalhou muitas vezes com moradores de rua e por isso sempre teve apresso por suas histórias e os tratava muito bem. Rubens, por sua vez, não gostava muito de se misturar por uma questão pessoal de ser muito reservado, no entanto conhecia bem o amigo e aceitava sua forma não convencional.
Como resposta ao senhor, Ricardo lhe ofereceu que se sentasse por um tempo com eles e que aproveitasse para ajuda-los a definir o que era empatia. O senhor, aceitando se sentar, optou por não falar seu nome quando foi perguntado por Rubens e pediu para que ambos lhe dissessem o que acreditavam ser empatia primeiro. Ricardo deu início à prosa.
- Empatia para mim é conseguir sentir a dor do outro... É compreender como a outra pessoa se sente. Uma pessoa que possui muita empatia é muito sensível e entende o outro, por isso muitas vezes sofre junto com as outras pessoas. É uma espécie de sentir no outro.
- Durante um assassinato, a pessoa que tem muita empatia entende a vítima e sente suas dores? – indagou o senhor.
- Sim, a pessoa que possui muita empatia, ao meu ver, compreenderia fortemente o sentimento da vítima – respondeu Ricardo.
- Eu concordo com o Ricardo, mas gostaria de adicionar algo que também considero pertinente. A empatia é mais do que sentir a dor do outro, porque quando pensamos sentir a dor do outro, usamos nós mesmos como ponto de referência. Mas isso é perigoso, porque talvez o ato para nós não represente um ato doloroso. É necessário então nos perder, tentar nos sentir o outro e compreender aquele ato como se estivéssemos em sua pele. Definitivamente o empata é assim. Ele sente a dor da vítima, sente exatamente o que a vítima está sentindo - complementou Rubens.
- Muito obrigado por me deixarem ouvir vocês... Vocês falam muito bonito e teve vezes que até demorei pra entender. Eu concordo que isso tudo é sim empatia, mas acho que ela é ainda maior. A gente fica muito preso em apegos e aversões e isso vai limitando a gente. No caso do assassinato eu te diria que uma pessoa que tem muita empatia não sente só como a vítima, mas como todo mundo que está envolvido ali. Todo mundo que está ali merece atenção, não é verdade? Existem muitas dores ali naquele momento, a maioria delas a gente não consegue entender e talvez nunca consiga... Mas a empatia em seu estado mais puro não é seleta, ela não escolhe um ou outro, quem escolhe é a gente que tenta manipular uma coisa tão bonita quanto a empatia e escolher quem que a gente vai tentar entender.
Após a fala do senhor todos ficaram assustados com a maneira simples com que ele expressava coisas complexas; não parecia algo comum. Ainda atentos, ele prosseguiu sua fala.
- Eu conheci uma pessoa que era um empata de verdade e eu falo pra vocês, ele era muito parecido com uma pessoa indiferente. Eu não sei te explicar, porque ele não era nada indiferente, mas como ele, pelo dom que recebeu, conseguia entender toda a situação, parecia que ele não enxergava certo e nem errado, bom e nem mal. É uma coisa um pouco diferente da indiferença, porque na indiferença você simplesmente não liga pras pessoas. Ele era diferente, ele ligava muito e sempre ajudava a todos quando tinha a possibilidade, nunca perdeu uma oportunidade de fazer o bem, mas quando acontecia algo que a gente considera errado, eu nunca vi ele tomar nenhum lado. O silêncio sempre fez parte enquanto a gente falava mal de quem fez coisas erradas. Até que um dia eu perguntei pra ele o porquê que ele ficava tão silencioso e ele me respondeu que a única pessoa que é capaz de julgar é a que desconhece. Ele disse que se a gente tivesse o conhecimento das coisas a gente não ficaria julgando, porque na falsa sensação de acreditar saber de tudo, a gente quer fazer o mundo do nosso jeito, mas sempre existe algo acontecendo, a todo momento. Então pra mim empatia é isso... Empatia é entender tudo. Se a sua empatia é escolhe, é porque não é empatia, deve ser alguma tentativa do ego de provar que o jeito que você gosta que as coisas tomem forma é o correto – finalizou o senhor.
Ricardo e Rubens ficaram embasbacados e chocados com o que foi dito. Como poderia um senhor daquele explicar algo tão complexo de uma maneira tão simples e com tanto sentido? O silêncio reinou por um momento, até que o senhor o quebrou, levantando-se.
- Desculpa, acho que falei demais... Preciso ir agora, mas estou com muita fome, vocês têm algum trocado para me ajudar?
Ambos juntaram um certo dinheiro e entregaram ao senhor, que lhes sorriu e agradeceu. Da mesma forma surpreendente que chegou, ele também foi embora, deixando os amigos no bar pensativos e atordoados.
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