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Em busca do tesouro. Parte 3

  • 24 de nov. de 2020
  • 3 min de leitura

No caminho para a próxima cidade, ao contrário do caminho passado, o jovem passou por uma grande floresta, muito densa e fechada. Lá ele encontrou uma vasta fauna, uma variedade quase infinita de flora e muita, mas muita água.


O caminho lhe veio como uma reflexão. Ora, se estamos sobre a sabedoria, como pode ela se manifestar como o seco deserto e, opostamente, como essa vasta mata? Algo não parecia se encaixar, mas ao mesmo tempo tudo parecia um conjunto de situações que não são tão diferentes assim; essa era sua sensação.


Se no deserto o sol escaldante foi seu problema, na floresta seu incômodo ficou por conta da grande variedade de insetos – e da necessidade de se esconder bem dos predadores à noite. O jovem não conseguia entender como poderiam essas diferenças desaguar em alguma semelhança, mas a inquietude era tão grande em seus pensamentos que a ausência de conclusão lhe parecia natural.


Assim que chegou à próxima cidade, também observou uma cidade completamente diferente da cidade anterior, ou mesmo de sua vila. Era uma cidade muito maior, com pessoas com vestimentas diferentes, costumes diferentes e que viviam em um estado mais frenético de urgência de vida.


Reflexivo, o jovem sentou-se à beira de um pequeno lago e se pôs em reflexão. Pensou sobre o que o senhor havia lhe dito, sobre suas experiências. Por alguns instantes, abandonou a consciência, os conceitos e os preconceitos pessoais e ergueu-se sobre si mesmo. Nesse momento, pensou sobre sua experiência no deserto. Não tivesse passado pela experiência no deserto, que para ele foi dolorosa, não encontraria o senhor e não estaria à beira desse rio. Sua alma, erguida além das experiências físicas, agradeceu à experiência do deserto e considerou-a melhor do que qualquer tipo de comodismo, que jamais o teria retirado de sua vila.


De volta à sua consciência, refletiu agora sobre essa dualidade: talvez o que fosse feliz para a pessoa, fosse infeliz para a alma, assim como o que fosse infeliz para a pessoa, fosse feliz para a alma. É como se nós, quando materializados, buscássemos agrados para a carne, mas a alma não tem interesse em agradar a carne, mas em adquirir conhecimentos. Como o conhecimento e a sabedoria não são da carne, mas da alma, a carne não se interessa nisso, por isso a ela resta o que pode ser concebido pelos sentidos.

Mais do que buscar em sua jornada algo que fizesse sentido e que se equiparasse à sabedoria, ficou claro para o jovem que ele deveria abrir seus olhos para encontrar sentido e sabedoria em tudo o que ele vive. Ele deveria encontrar a sabedoria do deserto, a sabedoria das águas, a sabedoria da vila, a sabedoria do frenético... Deveria encontrar o que nas vivências que ele possui que podem tocá-lo.


Ficou claro, naquele momento, que mais do que procurar momentos felizes, ele deveria encontrar a felicidade nos momentos em que vive. Nesse instante o jovem se sentiu leve, iluminado, foi como se uma chave tivesse virado em sua cabeça. Tudo agora tinha um sentido completamente diferente que antes, parecia que ele havia se tornado outra pessoa.


Apesar disso, lhe veio a certeza de que o senhor havia lhe contado. Agora ele sabia que a sabedoria não poderia ser encontrada de repente, mas que seria paulatinamente adquirida. Não havia lugar onde a sabedoria poderia se esconder, ao contrário, ela não se escondia, estava em todos os lugares, nós é que não tínhamos a capacidade de enxerga-la. Era isso que ele precisava: aumentar sua capacidade.


Foi aí que lhe veio a primeira certeza: a de sua incapacidade, de sua ignorância. Então lhe veio a segunda: a de se aprimorar, de se tornar mais capaz. Agora sua busca ganhou um novo sentido, já que ele não buscava mais algo de fora para modificar dentro, mas sim a modificação interna para poder enxergar de maneira diferente aquilo que está fora.


Com clareza lhe foi revelado que os fatos, a vida, são simplesmente fatos, é simplesmente vida. Eles não são ruins, não são bons. Nós, a partir do nosso olhar, é que lhes designamos adjetivos. Conforme nosso olhar muda, esses adjetivos também se alteram. Nosso olhar pode mudar conforme alternamos nossa capacidade de percepção do todo. É como se oceano, quando olhado da praia, fosse totalmente plano e em algum momento fosse cair no infinito, no entanto ao olhar do universo, percebe-se a forma arredondada e contínua com que ele flui.


Já com a mente imersa em tantas reflexões, ao final da tarde buscou uma pensão para repousar para, no dia seguinte, buscar novamente um lugar em que pudesse trabalhar por um tempo naquela cidade. Nada havia mudado na sua vontade de viajar, de conhecer as cidades. O que havia mudado estava dentro, era a forma como percebia todo o mundo.


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